A Dança das Estrelas e o Compasso: Uma Comparação Entre Thelema e a Maçonaria

O que a Maçonaria e a "Lei" de Thelema, difundida por Aleister Crowley podem ter em comum? Vamos estudar um pouco e compreender melhor essas relações.

Adriano Campos

5/8/20245 min read

A Dança das Estrelas e o Compasso: Uma Comparação Entre Thelema e o Rito Escocês Antigo e Aceito

Em um mundo cada vez mais sedento por significado e autoconhecimento, doutrinas esotéricas como Thelema e a Maçonaria se destacam como faróis que prometem iluminar o caminho. Ambas as ordens, apesar de suas diferenças marcantes, compartilham um fascínio pelo oculto, pela simbologia e pela busca incessante pela Verdade. No entanto, enquanto a Maçonaria se ergue sobre alicerces tradicionais de fraternidade, moralidade e aprimoramento gradual, Thelema, a "criança rebelde" concebida por Aleister Crowley, ruma em direção à auto-deificação e à libertação individual através da Vontade.

A jornada maçônica, em sua essência, é um processo de lapidação. O iniciado, partindo da pedra bruta, busca remover as arestas de suas imperfeições através do estudo, da introspecção e da prática da virtude. O REAA, com seus 33 graus, traça um mapa detalhado dessa jornada, guiando o maçom por um labirinto simbólico que vai desvendando os mistérios da natureza e do próprio ser. Cada grau apresenta novos desafios e ensinamentos, aprofundando a compreensão do iniciado sobre si mesmo, sobre a humanidade e sobre o cosmos. A ênfase na fraternidade, na caridade e no aprimoramento moral permeia todos os graus, consolidando a visão de que o objetivo final da Maçonaria é o aperfeiçoamento da humanidade, pedra por pedra, construindo um templo espiritual à virtude.

Thelema, por outro lado, se apresenta como um chamado à revolução individual. A "Lei", revelada a Crowley em 1904, se resume na máxima "Faze o que tu queres há de ser o todo da Lei", uma exortação à descoberta e à manifestação da Vontade Verdadeira, a essência divina que reside em cada indivíduo. Essa busca, no entanto, não se confunde com hedonismo ou libertinagem. Crowley enfatizava que a Vontade Verdadeira se manifesta em harmonia com o Cosmos e que a verdadeira liberdade reside na compreensão e na aceitação da própria natureza, livre dos grilhões da repressão social e das amarras morais impostas.

A divergência entre os caminhos se torna mais evidente ao analisarmos o papel da divindade em cada sistema. A Maçonaria, embora não seja uma religião, exige de seus membros a crença em um Princípio Criador, o Grande Arquiteto do Universo. Essa divindade transcendental, independente de dogmas ou denominações específicas, atua como um princípio ordenador e garante a moralidade como base para o progresso humano. A busca pelo conhecimento da obra do Grande Arquiteto é um dos motores da busca maçônica, uma jornada simbólica representada pela construção do Templo de Salomão.

Thelema, em contrapartida, propõe uma visão não-dualista do divino, onde o indivíduo é parte integrante e indissociável do Todo. A "fórmula mágica" de Crowley, "Abrahadabra", encapsula essa união entre o microcosmo e o macrocosmo, representando a realização do potencial divino inerente a cada ser humano. A divindade, em Thelema, não está distante ou inacessível, mas reside no âmago de cada indivíduo, aguardando ser descoberta e manifestada através da Vontade.

Em relação à estrutura e à organização, a Maçonaria se caracteriza por sua hierarquia bem definida e seus rituais tradicionais. A progressão gradual pelos graus, a simbologia rica e o juramento de segredo criam um senso de comunidade e perpetuam ensinamentos ancestrais. A figura do mestre, detentor do conhecimento e guia do iniciado, desempenha um papel fundamental nesse processo, representando a sabedoria acumulada e a tradição maçônica. As Lojas maçônicas, espalhadas pelo mundo, servem como pontos de encontro para os maçons, locais onde os rituais são realizados e os laços de fraternidade são fortalecidos.

Thelema, em contraste, se mostra avessa a dogmas rígidos e hierarquias inflexíveis. Crowley, apesar de ter fundado a A.'.A.'. (Astrum Argentum) e a Ordo Templi Orientis (O.T.O.), via a organização como um meio para o desenvolvimento individual e não como um fim em si mesmo. A ênfase recai sobre a experiência pessoal, a intuição e a busca individual pela Verdade, encorajando a experimentação e a interpretação individual dos princípios thelêmicos.

No campo da ética e da moral, encontramos mais um ponto de divergência. A Maçonaria se fundamenta em valores universais como a justiça, a honestidade, a fraternidade e o amor ao próximo. O maçom é incentivado a ser um cidadão exemplar, contribuindo para o bem-estar da sociedade e para a construção de um mundo melhor, trabalhando para o progresso da humanidade. A ética maçônica valoriza a retidão de caráter, a integridade e o compromisso com o bem comum.

Thelema, por outro lado, rejeita a moralidade tradicional baseada em imposições externas. Para Crowley, o único "pecado" é a restrição da Vontade Verdadeira. A ética thelêmica se baseia na ideia de que cada indivíduo deve descobrir e viver de acordo com sua própria natureza divina, respeitando o direito dos outros de fazerem o mesmo. Em Thelema, não existem "pecados" no sentido tradicional, mas sim ações que impedem a realização da Vontade Verdadeira, tanto individual quanto cósmica.

Apesar das diferenças, é possível traçar paralelos entre os dois sistemas. Ambos valorizam o autoconhecimento, a busca pela verdade e o aperfeiçoamento pessoal. Tanto a Maçonaria quanto Thelema utilizam a simbologia como ferramenta para acessar o inconsciente e desvendar os mistérios do universo. Através de símbolos, mitos e alegorias, o buscador é convidado a decifrar os enigmas da existência e a penetrar nos níveis mais profundos da realidade. Além disso, ambas as ordens reconhecem a importância da intuição e da experiência pessoal na busca pelo conhecimento, sem negar a importância do estudo e da razão.

Em última análise, a escolha entre trilhar o caminho maçônico ou o thelêmico depende da natureza individual e do objetivo almejado. A Maçonaria se apresenta como um caminho seguro e estruturado, ideal para aqueles que buscam aprimoramento moral, fraternidade e integração social, oferecendo um sistema de valores sólidos e uma rede de apoio mútuo. Thelema, por sua vez, atrai os espíritos mais independentes, que anseiam por romper com os grilhões da tradição e desbravar os recantos inexplorados da consciência, convidando o indivíduo a trilhar seu próprio caminho em busca da Verdade.

É importante ressaltar que a comparação aqui apresentada é apenas uma breve pincelada em dois sistemas complexos e multifacetados. A Maçonaria, com sua história milenar e suas inúmeras ramificações, oferece um rico universo simbólico a ser explorado, um universo repleto de rituais, graus, lendas e ensinamentos que continuam a fascinar e intrigar os estudiosos até os dias de hoje. Thelema, por sua vez, continua a evoluir e a se transformar, inspirando novas interpretações e abordagens, desafiando os limites do pensamento e da experiência humana.

Independentemente do caminho escolhido, o importante é que a busca seja autêntica e que o buscador esteja disposto a se confrontar com suas sombras e a se abrir para novas realidades. Afinal, tanto a Maçonaria quanto Thelema, cada uma à sua maneira, nos convidam a transcender os limites do ego e a vislumbrar o potencial infinito que reside em cada um de nós, a buscar a Luz e a contribuir para a construção de um mundo melhor.

Que o G.’.A.’.D.’.U.’. a todos ilumine e guarde.

Or.’. de São Paulo, 25 de setembro de 2024 (E.’.V.’.)

Fraternalmente,

Adriano Campos – M.’.M.’.